terça-feira, 30 de outubro de 2007

Décadence Avec Élégance...


Chegamos aqui e o apto estava muito bem equipado se comparado aos de todos os outros Brazucas e demais imigrantes que aqui ancoraram. Tinhamos cama, sofa, TV, mesa, cadeiras, berço, fogão e geladeira, além de utensílios de cozinha. Mas é claro que faltava muita coisa, afinal desmanchamos um apartamento em Sampa, e o metemos em 12 malas. Ou será que foram 13... De qualquer forma, montar tudo de novo requer calma e sorte, pois sempre tem alguém dispensando algo aqui, ou vendendo algo lá, e sempre se aproveita o que dá pra não comprar tudo e gastar fortuna.
Logo na primeira semana a Angélica chegou da rua afoita, e chamou Bibi e eu pra vermos a cadeira que estava do outro lado da rua, no lixo. Como já sabemos, aqui também existem artigos dispensados via "lixo", que nada mais é do que uma forma de se doar algo sem saber pra quem. Desci as escadas junto com a Bibi, pedi a ela que ficasse observando da porta e fui em direção a tal cadeira, que realmente parecia inteira e bonita, de madeira e tecido, em pé próxima a guia do outro lado da rua. Durante o percurso, talvez pela insegurança de quem acabara de chegar ao país de uma longa viagem, e após um longo processo de imigração, e com todos os medos que isso acarreta, pensei naquela situação como se algum dia tivesse que viver do lixo por necessidade. Fiquei com mais medo. Lembrei dos meus pais que certamente não gostariam de me ver naquela situação: pegando algo do "lixo" pra usar. Desço a escadinha curta da frente da casa e chego à calçada ainda deste lado. O medo da lugar ao orgulho e penso no quanto já trabalhamos, no conforto do que deixamos pra trás... Agora lá estava eu prestes a praticar algo que sempre me sensibilizou ao ver as pessoas no Brasil fazerem. Desço da calçada e estou prestes a cruzar a rua. Ainda mais com minha filha me olhando. Acho que não vou conseguir... Que humilhante pensar que mais tarde minha filha vai guardar esta imagem de nossa vida aqui... Mas não posso recuar agora. Tento atravessar mas sou impedido por um furgão velho que corta minha frente, despertando-me destes pensamentos todos, e simplesmente pára entre eu e os objetos que eram até então o meu alvo... É, ele parou no meio da rua, sem desligar o carro desceu, e começou a fuçar as coisas! Não é possível!!! Hesitei tanto que o cara chegou na minha frente!!! Olho pra trás e a Bibi ta com a maior interrogação do mundo no rosto... Agora é questão de honra: esse lixo é meu!!! O cara abre a porta de trás do furgão, mete um monte de coisa pra dentro, entra no carro e vai embora. Minha visão volta a contemplar o que restou do lixo. Ele queria apenas os metais... A cadeira lá estava intacta! Mais do que depressa atravessei a rua e peguei não só a cadeira como também uma mesinha ótima que estava ao lado. Volto com as coisas e a Bibi ta feliz da vida. As crianças não tem nossos bloqueios, nossos paradigmas, nossos monstros de Halloween...
Amanhã é Halloween, o bairro esta todo enfeitado. A Bibi vai sair pro "Treak-or-Treat" vestida de Blanche-Neige (Branca de Neve). Ela estava chorando hoje porque disse que vai ficar com saudades dos amigos da escolinha daqui!!!
O Cai adora a aula de música da escola, qualquer coisa que emita som agora é motivo pra dançar...
Angélica e eu hoje passamos no exame escrito pra carta de motorista. Nosso exame prático será dia 11.Dez.
Acima um Prt-Scr da temperatura lá fora agora...

Um comentário:

Anônimo disse...

Marcelinho, toda vez que eu entro neste BLOG, minha mulher e a minha filha ficam do meu lado, querendo ler junto comigo. Isto é uma diversão e uma viagem para nós. A minha esposa disse, "caso ele nõ consiga um bom emprego, com certeza será um ótimo escritor." Em relação ao pegar ou não a cadeira, se fosse eu pegava o lixo todo e depois separava o que eu queria e o resto, voltava a jogar no LIXO. Abraços e até a próxima. Marcos Tomaz e família.